MAMA ÁFRICA – PARTE 3

Hoje resolvi contar algumas curiosidades dessa minha viagem pela África. Costumes e tradições aqui de Camarões, esta terra africana tão intensa.

Na maternidade:

Trabalho numa maternidade e é impossível não notar que a maioria das mulheres chegam sozinhas para dar a luz. Muitas vezes, elas caminham longos trechos a pé e os filhos nascem quase no portão do hospital. Outro dia, uma mulher parou para descansar e em poucos minutos entrou em trabalho de parto. Saí correndo para buscar uma roupinha para seu bebê, quando voltei  na sala de parto dei de cara com uma linda e saudável  menininha. Vejam só a alegria e surpresa dessa mãe no registro abaixo:

Vi poucos homens visitando suas mulheres e crias. Nem aparecem para uma visita. Muito menos para pagar conta do hospital. A mulher fica esperando até que alguém venha resgatá-la.

Os bebês, geralmente, nascem sem complicações. Mas alguns precisam de cuidados extras – temos apenas o mais básico por aqui.

Registrei um bebezinho que não chorou e precisamos levá-lo para reanimação. Dá uma olhada:

A morte:

Quando uma pessoa morre, coloca-se o morto em uma geladeira.  A família faz festa por mais de um mês para que o falecido siga alegre para o outro mundo. Essas geladeiras são alugadas.

Se a família não tiver dinheiro pra o aluguel, fazem o velório em casa mesmo e enterram no quintal.

Toda sexta-feira é dia de tirar os mortos da geladeira, levar para casa e no sábado começa a festa. Quando o morto é o pai da família, o filho mais velho é o responsável por anunciar a causa da morte para os convidados. Começa a festa. Vi isso de perto nos vilarejos por onde passei a caminho de Bartouri.

Dia Internacional da Mulher – 8 de março

Tive o prazer de comemorar com as mulheres de Camarões essa data tão especial.

Nesse dia, as mulheres deixam maridos e filhos em casa e saem pelas ruas para beber, dançar e desfilar seus KABÁS, vestimenta tradicional africana.

Esses kabás são feitos com tecidos estampados, desenvolvidos especialmente para este dia.  A casa onde moro trouxe uma costureira/estilista que fará nossas roupas.

E eu coloquei meu kabá e saí com as mulheres aqui do hospital.

Elas, com suas “perucas” (sim, seus cabelos são postiços!), maquiagem e muita vontade de se divertir.

Paramos em um bar com mesa já reservada. A festa iria começar.  A mulherada começou a tirar muita comida das bolsas: frango e peixe frito, arroz, feijão, batata, mandioca e salada de fruta. Comiam com a mão mesmo.  Depois caíram na pista para dançar e beber por muitas e muitas horas, uma linda dança camaronesa (uma mistura de funk com sessão de umbanda em noite de preto velho). Como boa brasileira que sou, dancei até me acabar….Elas ficaram espantadas com o meu gingado, chacoalhando o quadril e todo resto.

E eu contei pra elas: “Ahh nega, tu não conhece o remelexo do meu país…da onde eu venho, quem não gosta de samba, bom sujeito não é…é ruim da cabeça ou doente do pé.”

 

Paula Scarpato – relações públicas de formação, 35 anos, aquariana, com ascendente em leão e lua em sagitário… essa sou eu!!! Após 12 anos atuando em mercado fonográfico e publicitário, resolvi partir para uma experiência que ninguém poderia vivenciar por mim: pedi demissão de meu cargo de Gerente de Marketing. O destino escolhido foi a África, com a missão de trabalhar para os mais necessitados. E assim fui.

MACAQUINHOS NO SÓTÃO

O calendário me pega pelo pé. A pouquinhos dias da Flip e da Flipinha e ainda, depois de uma lista-listona de 30 livros indicados como os melhores do ano pela Revista Crescer e da lista do  Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) , eu aqui teimando em contar mais do cenário off-comentados

Tem muita coisa boa na literatura infantil e infantojuvenil hoje. Mesmo.  Mas vez por outra, quando vejo, a tribo resolve brincar de figurinha duplicada e indica quase sempre os mesmos títulos, autores e ilustradores. Fico feito gorila ranzinza. Afinal, temos a floresta inteira! Vale mudar de cipó e falar de um monte de história e de gente bacana que ainda não ganhou a floresta – e que os macaquinhos adoram!

Quer ver? Dentro deste livro moram dois crocodilos de Claudia Souza (ed. Callis,  uma turma que vale ficar de olho!) com as ilustras-ilustres feitas de recortes, fotos, sombras, colagens e texturas, marca registrada da talentosa Ionit Zilberman.  O livro é um atalho colorido para fugir do medo. Ahan.

A vida de um articulado menininho e seus simpáticos óculos verdes fica bastante movimentada por seu medo de crocodilos. Logo ele, que não tem medo de palhaço nem de estouro de balão, de dragão-de-komodo, nem de cobra, de fantasma, de altura… ele não tem medo de nada disso. Mas de crocodilo se assusta até com desenho.

O medo é tanto que passa a ter medo da hora do medo chegar. Até que um dia sua mãe lhe faz começar a entender que, apesar de suas bocas assustadoras, de sua pele escamosa e seus olhos ameaçadores, os crocodilos desenhados no livro – e mesmo aqueles da TV –  podem não ser tão pavorosos. Que um dia a gente descobre ser maior e mais forte do que os medos que a gente sente. E que quando esse dia chegar, aqueles dois crocodilos bem grandões que moram no livro podem parecer dois calanguinhos. E vai ser até engraçado pensar que um dia nos fizeram tremer!

Quem não lembra dos medos da infância? O menininho dos óculos verdes visita todos eles. E, acreditem, ele também nos resgata um tanto do quarto escuro. A vida passa, a gente cresce e os medos mudam. Mas nossos filhotes reencontram,  nos momentos em que menos esperamos,  o bicho-papão que conhecemos lá atrás, nas formas e cores que nem imaginamos.

Nada  como um colo, uma almofada e uma boa história pra espantar de vez o medo de ter medo.   Como o conforto de uma clareira em noite de céu estrelado.  Então bóra ligar o mode mammys contadoras de histórias pra embalar uma infância pra lá de especial para os nossos filhotes!

Drops da selva:

– o livro também foi traduzido para o inglês. Oba!

– a Callis classificou o livro com indicação para crianças a partir dos 5 anos. Mas adianto que, com um bom papo e algumas pequenas e curtas adaptações, você consegue fazer o seu filhote aproveitar bastante bem antes disso.

– e, sim, alguns dos livros repetecos valem o passeio pelas listas. Mas não vale virar macaco de imitação. Pronto, falei.

Por

O BICHO QUE NÃO SAI DA CABEÇA

Sorria: você está no mundo feroz e peludo de Barbara Keal.

Escultora inglesa, Keal experimentou diversas materiais, até encontrar a sua verdadeira paixão: o feltro.

Com ele, cria chapéus inspirados em animais ou criaturas. São raposas, alces, estranhos minotauros ou o que a imaginação permitir.

As peças são feitas com sobras de lã doadas por agricultores locais. Esses restos de lã são limpos e cardados e voltam  para o estúdio da artista. Nascem os chapéus.

Barbara acredita no poder de felicidade que essas enormes orelhas peludas podem nos dar.

A felicidade eu não sei, mas um belo sorriso, com certeza!

 

MAMA ÁFRICA – PARTE 2

Minha rotina é assim: da casa pro hospital, do hospital pra casa. Ajudo na farmácia, no pré- natal, vacinação, no administrativo e em tudo mais que precisarem de mim. Trabalho é o que não falta por aqui…

Não me atrevo muito a sair sozinha, pois além do meu francês estar bem meia boca, outro dia, resolvi dar um passeio com o Christian, um menino órfão cujas freiras adotaram sua educação.

Caminhávamos até o centro. Avistei um bosque de eucaliptos bem bonito e resolvi parar, comprar um refresco de malte pro garoto e descansar um pouco para a volta. Em menos de dois minutos apareceram duas mulheres, chamando o menino de lado. Cinco minutos mais e, mais de vinte pessoas estavam no rodeando. Tudo muito rápido.

Comecei a perguntar quem falava inglês pra me explicar o que estava acontecendo. Arrancaram bruscamente a garrafa de malte dele e todos falavam ao mesmo tempo.  Descobri que estavam achando que eu era traficante de crianças, apontavam para minha tatuagem no pulso como sendo um sinal do demo ou algo parecido. Minha sorte é que eu já tinha um celular, liguei paras freiras do hospital e elas vieram nos resgatar. Ufffa…que sufoco!

Já deu pra sentir que ser branco por aqui, não é nada agradável.  Saio na rua e escuto o tempo todo: “Hey branca! Hey branca!”. Rola mesmo um preconceito. Deve ser porque branco é rico e já aprontou muito nesse continente.

Em Camarões, não há mestiços como em outras regiões da África. Brancos por aqui, são missionários europeus, diplomatas ou albinos.

Não dá para passar desapercebida por aqui e curioso: meu cabelo é a sensação. Sempre perguntam se é de verdade, já que mulherada aqui usa peruca e umas das mais procurada é o tal “cabelo brasileiro”.

Entendi, está dado o recado. Percebi que é melhor sair acompanhada pelas freiras ou padres.  Aproveito quando eles saem para comprar alimentos ou mesmo em missões.

E lá fui eu, agora acompanhada, com destino a Bartouri, cidade que fica a 360 km de Yaounde, minha base.

Acreditem, foi uma jornada de dez horas até o destino final (seria bem menos tempo se a estrada fosse pavimentada, é pó prá tudo quanto é lado). Já na ida esperamos 4 horas até o ônibus sair. Perguntei o porquê, se já tínhamos a passagem comprada e tudo mais. O que rola é que, se o ônibus não enche, não sai…hahaha…então só nos restou esperar! Todo mundo entulhado e com o som no ultimo volume.  Primeira parada: Bertoau. Embarcamos agora em uma van  lotada e sem janelas, que nos levou por mais cinco horas, numa estrada de terra…infinita.

Aventura das mais roots. Chegamos pela manhã e fomos recebidas por lindas crianças de um jardim da infância de  Batouri.

Valeu demais a jornada: pelo céu estrelado, pela estrada infinita, pela magia que existe no SIMPLES da vida, como me mostraram a pequena Belina e seu amigo florista…

 

Paula Scarpato – relações públicas de formação, 35 anos, aquariana, com ascendente em leão e lua em sagitário… essa sou eu!!! Após 12 anos atuando em mercado fonográfico e publicitário, resolvi partir para uma experiência que ninguém poderia vivenciar por mim: pedi demissão de meu cargo de Gerente de Marketing. O destino escolhido foi a África, com a missão de trabalhar para os mais necessitados. E assim fui.

Macaquinhos no sótão

Demorei para decidir que este seria o primeiro texto da coluna. Sentei com pose de jornalista e nada. Baixou a blogueira, voltou a agente literária e tsc tsc tsc. Só depois de muito risque & rabisque, me sentei no cantinho do sofá. Eu, as almofadas e minhas meias coloridas e aí encontrei. Não o texto prontinho, feito sob encomenda, não. Encontrei aquela menina loirinha que fui lá atrás. Aquela que sentava bonecas, bichos de pelúcia e playmobil, todos lado a lado na cama para a hora da história.

Foi aquela menina loirinha que me empurrou para a literatura. Hoje, o que tenho de mais especial são as histórias que trago em mim. Aquelas herdadas, que a gente conta por ouvir contar, aquelas dos livrinhos vendidos em jornaleiro, aquelas da hora do recreio, aquelas que me faziam dormir… O tempo passa e um dia entendemos que o que pode haver de mais mágico são as histórias – são elas que nos acompanham na vida, são elas que nos fazem crescer. Daí, nos encontrarmos aqui para falar um tantinho das histórias que vão colorir a infância dos nossos filhotes.

Hoje, entre as folhagens, um livro que inspira gente pequenininha e gente grande –  Elefante? de Ruth Rocha (ed. Salamandra). Mári uma menina de maria-chiquinhas teve um sonho ‘extravagante’: sonhou que era um elefante bem grandão e que balançava sua tromba de um lado para o outro. Quando acordou em seu quarto cor-de-rosa não sabia se era uma menina  que sonhou ser um elefante ou um elefante que estava sonhando ser uma menina. A busca dessa resposta é uma trilha e tanto! “E se a realidade for sonho e o sonho for realidade?” – quem nunca pensou que sonhava acordado? Tudo contado com as ilustras deliciosas de se ver(!) de Flávio Fargas, o pai da Sofia e do Mateus.

O livro faz parte da série Vou te contar – uma coleção de títulos escritos por Ruth Rocha entre os anos de 1969 e 1981 para a revista Recreio.

De galho em galho vamos passear entre os livros mais bacanas de todas as infâncias. Esse é só o começo. Temos a floresta inteira.

Por

 

MAMA ÁFRICA – PARTE 1

A idéia de viajar para a Africa surgiu não só da vontade de desbravar o continente mais antigo da terra e sua rica cultura, como também, ver de perto a realidade de um mundo que está bem longe de nossos olhos, por vivermos “dentro da bolha” de uma cidade grande.

O país da África ainda estava indefinido. Porém, pesquisando alguns projetos humanitários por aí (e digo que tem muitos, incluindo um grande “mercado” turístico de voluntariado), CAMARÕES, país de língua francesa, acabou me escolhendo para a vivência dessa jornada.

Vim parar em Yaoundé, no sul de Camarões. Por aqui não existem serviços gratuitos de saúde e educação. Fui trabalhar em um pequeno Hospital/Maternidade no bairro de Mvog-Ada, o Centro de Saúde e Maternidade Mont Calvaire. Aqui todos os partos são naturais e o paciente paga uma quantia simbólica apenas para pagar os custos básicos e o restante é mantido por entidade religiosa e freiras missionárias que fazem um trabalho de tirar o chapéu!

Meu primeiro passeio foi no sábado, Dia de Casamentos em Yaoundé. Percebi que existia uma movimentação diferente quando vi carros parados em frente às barracas de flores sendo inteiramente decorados. Fomos até a igreja matriz e uma banda tocava na porta recebendo os convidados.

As freiras me contaram que por ser um casamento de um branco com uma negra, a festa seria maior ainda. As madrinhas vestiam roupas pra lá de coloridas. Todas usavam o mesmo tecido estampado, porém em modelos diferentes. As crianças tinham seus cabelos trançados como eu nunca tinha visto na vida. Sem falar nos gritos e sorrisos entusiasmados dos convidados.

O país é predominantemente católico e as cerimônias são encantadoras. Cânticos são recitados em dialetos locais (são mais de quatrocentos dialetos), acompanhados por um belíssimo coral tocando o Djembé (tambor africano) no meio da reza.
Depois da cerimônia, segui para a periferia, onde uma das religiosas faz um trabalho de educação. Lá quase cinquenta crianças, amontoadas em uma sala bem pequena , tinham aula de canto e dança.

Cantavam lindamente e fizeram uma apresentação de dança local assim que eu cheguei. Levei uns pirulitos brasileiros que fizeram o maior sucesso. Apesar de meu francês muito fraco, pude compartilhar um pouco da cultura brasileira, apresentando nossos ritmos e danças.

Isso é uma pequena amostra de tudo o que vejo em minha nova rotina.

Não posso deixar de falar que vejo muita coisa triste também. Não é raro encontrar por aqui supermercados para brancos e outros para negros, transito caótico, leprosos pela rua, mulheres que chegam na maternidade sozinhas para dar a luz, sem ao menos a companhia do marido ou de algum familiar, ou ainda muitos casos de crianças que desaparecem completamente, fazendo o disparar o índice de tráfego humano para retirada de órgãos ou adoção clandestina.

Enfim… comecemos pela parte boa da história. Tem muito ainda pela frente! AU REVOIR…

Paula Scarpato – relações públicas de formação, 35 anos, aquariana, com ascendente em leão e lua em sagitário… essa sou eu!!! Após 12 anos atuando em mercado fonográfico e publicitário, resolvi partir para uma experiência que ninguém poderia vivenciar por mim: pedi demissão de meu cargo de Gerente de Marketing. O destino escolhido foi a África, com a missão de trabalhar para os mais necessitados. E assim fui.